terça-feira, 18 de agosto de 2009
Aula de Pneumatologia - Surto x Silêncio com o Pe. Joãozinho, via blog
1-) Como você avaliaria a “Fome” ou “Surto” do Espírito que constatamos em nossos dias, após um tempo de “silêncio” do Espírito?
Acho que esse suposto “Surto” do Espírito está mais ligado ao advento da modernidade, por ocasião da revolução copernicana, na qual o o homem passa a ser o sujeito das transformações da natureza. Contudo, as mais altas tecnologias não respondem as mais profundas questões existenciais do homem.
2-) A força da pentecostalidade de um lado e a rejeição das formas de expressão intitucionalizada da religião mostra que talvez tenha chegado a tal “Era do Espírito”, predita por Joaquim de Fiore. Seria verdade?
Se verificarmos o que o povo acha, constataremos que o povo não tem atração por uma religião, como um catálogo de preceitos. Eles pensam que isso tiraria a sua liberdade de ir e de vir. Então, recorrem a uma teologia da prosperidade, que em certo sentido, permeia a RCC e as Igrejas Protestantes, pois essa Teologia exalta a individualidade, em detrimento da coletividade, o milagre fácil. Como o teólogo jesuíta Libânio disse, há marcas de neo-paganismo nessas tendências.
3-) Igreja e carisma se contrapõem? Por outro lado a Igreja Católica assiste a fenômenos de massa como é o caso da RCC e das expressões religiosas midiáticas que buscam aceitação institucional e popular. Poder e Carisma estão nas duas pontas desta corda. Como você vê tudo isso? As CEBs lutam por seu lugar na ponta do Carisma. Seria incômodo ter RCC e CEBs na mesma ponta? Ou uma das duas pulará para a ponta da Igreja instituição?
A história da Igreja nos ensina que os carismas floresceram no jardim da Igreja, sob os cuidados dos Papas. Não se contrapõem, todavia, para que esses movimentos de carismas específicos amadureçam, é preciso que sejam obedientes à Igreja, no sentido de dar tempo ao tempo para que a Igreja possa discernir, corrigir, aperfeiçoar, validar e apontar esse carisma como um caminho de santidade possível. Acho perfeitamente possível RCC e CEB’s atuarem em conjunto, desde que saibam que antes de mais nada, que são católicos por identidade. Cada um no seu específico e ao mesmo tempo, aprendendo com o outro.
4-) No chamado Primeiro mundo já se fala de civilização pós-cristã. A proposta ali é de uma religiosidade totalmente individual ao estilo New Age. Como pensar a ação da “pessoa” do Espírito Santo neste contexto? Ele é mais visto como uma “energia” impessoal e que deve ser dominada pela pessoa por meio de técnicas.
Essa civilização pós-cristã é marcada pelas filosofias marxistas, nietchziana e a psicologia freudiana. Um materialismo interdisciplinar acentuado, com o horizonte niilista. A vida é vista sob uma perspectiva físico-química, isto é, beirando à animalidade. A voz que as pessoas mais escutam é a do seu egoísmo. Quase não há espaço para uma escuta interior do Espírito, e nem espaço para ficar em silêncio consigo mesmo. Quando há esse espaço, é porque alguma espécie de sofrimento invadiu o coração do indivíduo. Aí pode-se abrir um canal de comunicação entre o Espírito e o indivíduo. E quando esse indivíduo escuta a voz interior, ocasionado pela monção do Espírito, se recorda das palavras do Cristo Senhor, e sente a necessidade de atualizar seus atos no presente da história.
A roda contemporânea
Em um contexto de grande industrialização, globalização, o homem não se sente totalmente satisfeito com as técnicas mais avançadas, pois elas não respondem as questões existenciais mais profundas do ser humano. Isso sem contar aqueles que estão privados de tais avanços, que criam novas espécies de analfabetismos, como o digital e o tecnológico. O Papa Bento XVI fala que vivemos em uma ditadura da técnica, tudo tende a ser altamente mecanizado e informatizado. A tecnologia não é nem boa e nem má em si mesma, dependerá sempre de quem está no controle dela. Paradoxalmente, quem acaba por estar no controle é a própria tecnologia, eleita pelo homem contemporâneo a solução de todos os problemas da humanidade. Ironicamente, essa tecnologia, acaba se voltando contra o próprio homem. A necessidade de tudo informatizar e mecanizar acaba gerando múltiplas exclusões de demanda humana no mercado. Se a revolução copernicana foi caracterizada pela supremacia do sujeito em relação ao seu objeto, hoje ocorre a olhos vistos a revolução tecnológica, na qual a tecnologia desenvolvida pelo homem assume o lugar do sujeito e o homem passa a ser seu objeto. Muito pertinente e oportuna é a tese de Adorno e Horkheimer na qual o Mito se transforma em esclarecimento e o esclarecimento se volta ao mito. Quando o se tenta desmitologizar a natureza, essa forma de esclarecer acaba por se tornar mito novamente, grosso modo. A contemporaneidade tem se pautado muito nesses aspectos.
segunda-feira, 10 de agosto de 2009
A chácara e a avó
Ontem, 09-08, dia dos pais, fui à chacará em Pirituba. Nem de longe se parece com aquela chácara daqueles bons tempos de infância. Tá certo, as coisas mudam, mudam muito mais do que poderia imaginar ou desejar. Tem os seus pontos positivos e negativos. Olho ao redor, não vejo mais o verde que alegrava meus finais de semanas, não vejo aqueles babuzais dos tempos de pipas, não vejo nas a jaboticabeira com sua generosidade trasmudada em frutos. Ah, sim, aquela jaboticabeira...que às vezes debaixo dela eu ficava para descansar, ou que por vezes subia para olhar de um lance só toda a chacara. Já não existe mais. Somente na alma, em um tempo onde a traça não pode corroer. Quando cheguei, me deparei com aquela portinha de madeira, que antes era azul e que hoje está pintada de bege. Lembro-me das vezes que chegava, que a minha avó Haydée me esperava, debruçada gritando de lá de cima da casa: "Cado, que saudade de você!" Mas vi que ela não estava lá. Por um momento, parei para esperar que viesse e me recordei que me esperavas na portinha de madeira, por aquele farto café da manhã, com sabor de família, simplicidade, como se estivesse no interior. E realmente estava. O almoço, a tarde conversando, passando a limpo a intimidade em família. Me lembrei que me esperavas no hospital, na UTI para que rezassemos o pai-nosso, a ave-maria, para que horas depois, se despedisse do tempo. E por isso que penso que não basta ser parente, é preciso ser amigo, intimidade que não me mede com palavras, mas com olhares que sabem fazer a leitura de uma alma. Invoco Mario Quintana: "De que me adianta os livros, se ainda não aprendi a ler as pessoas que estão ao meu lado?" A saudade é grande, mas a gratidão também é. A segurança de ter passado na vida das pessoas e ter vivido com intensidade cada momento com elas, é o segredo que preciso aprender cada vez mais. As pessoas também. Não adianta violentar o ser depois que a morte nos ceifa alguém especial e amado. É sintoma de que não houve um aproveitamento qualitativo. O amor no qual amamos as pessoas não nos autoriza transformá-las em propriedade particular. Pelo contrário, ensina-nos que o amor passa pelo crivo da liberdade, mas que deve ser vivo nos detalhes, intensamente, entretanto, as pessoas que amamos não nos pertencem. Indo mais longe, nem a nós mesmos nos pertencemos! Tive a experiência de amar minha avó que não mais encontra-se no tempo. Mas está no meu coração e nas recordações mais lindas que me fizeram ser homem e ser pessoa. O verde pode ser plantado novamente na chácara, mas a ausência dela povoa meu coração, mas não é mais forte do que a certeza de que ela vive no pensamento de Deus!
segunda-feira, 3 de agosto de 2009
Apresentação do CD Não precisa dizer nada
O amor é possível nos limites, na precariedade das situações, é o inverso da minha lógica, contradição da própria contradição. Um olhar me basta para retornar a esse instigante sentimento: a palavra que não prende o que significa, o valor que não dá o seu preço. Paisagens dos campos parecem acenar ao horizonte que em mim existem paisagens desconhecidas por trás dos montes. O amor não é mero verbo, na boca dos artistas e dos cantores, aproxima as pessoas com arte, no encontro e as suas cores. Dos encontros que são partidas e partidas que são chegadas sou verso de uma canção que me envolve, que me embala...
O eterno tempo que passa
Interessante pensar que alguns instantes que possuem maior repercussão que outros nos trazem uma idéia do que poderia vir a ser o eterno, o que não passa. Há algo no tempo que passa, que não passa, seria a idéia do eterno movimento, de que o passado nunca será o mesmo, que o presente nunca será o mesmo e que o futuro nunca será o mesmo. Ainda assim, há momentos eternizados no fundo da alma, que não são meros arquivos perdidos no tempo e no espaço da memória. Esses momentos ainda que ancorados no passado são estímulos para o presente e poderá sê-lo no futuro. A gênese das nossas alegrias e conquistas, fracassos e mágoas pululam diante dos nossos olhos, resta apenas saber se vale a pena prosseguir com tais circunstãncias ou abandoná-las e abrir-se às possibilidades do dia de hoje.
Diálogos da vida e da morte
Ultimamente, tenho pensado sobre o sentido da vida e no sentido da morte. Dormimos e acordamos. A dinâmica da respiração. As contrações do coração e dos pulmões. Processos nos quais estamos diante o tempo todo e quase não damos importância. No plano vivencial, vida e morte não são condições irreconciliáveis, dado que aceitando ou não, convivemos com essas duas realidades. O filósofo estóico Sêneca nos instrui a cada dia sermos organizados como se fosse o último e concluísse a nossa vida. Chama-nos a atenção de que a qualidade de vida é mais decisiva para a nossa felicidade, que não é isenta de conflitos e tristezas, do que a vida na perspectiva cronológica do passar dos anos. Olhar o mundo como se fosse despedida, para fazermos coisas melhores do que já fazíamos e sermos mais do que estávamos acostumados a ser, no sentido de plenitude da existência. São tantas as pessoas que encontrei e que já partiram. O tempo em que vivi com elas jamais será destruído. Trago um Kairós dentro de mim, um santuário feito de memória e recordações. Todavia, estou no Khrónos, no eterno devir, nas infinitas possibilidades para vida, que ao mesmo tempo afeta meu plano vivencial. Como Francisco de Assis, chamo a morte de irmã e vivo no ventre da mãe vida. O Mestre de Nazaré, aquele que tem a eternidade no olhar e no coração ensinou que "se o grão de trigo caindo na terra não morrer, fica ele só; mas se morrer, dá muito fruto." A condenação de não morrer é o cárcere da solidão eterna, dado o fechamento para as possibilidades da vida. A semente que não vingou, não pôde ir além de si mesma para dar frutos. Certamente, não é nem um pouco agradável ter uma experiência de morte, e que o diga a semente. Quando ela morre, abandona aquela forma de semente, fixa raízes na terra, cresce em direção ao alto e transborda em frutos. Torna-se uma árvore frondosa. Seus frutos trazem em si sementes da vida e deram mais vida a alguém, mesmo passando pela experiência da morte, da transformação. A mesma comparação aplica-se às alegrias e tristezas da vida. Sofremos com algumas tristezas, para que nossas alegrias sejam inteiras e múltiplas. Isso me faz lembrar muito de Ricardo Reis, um dos personagens de Fernando Pessoa: "Para ser grande, sê inteiro: nada teu exagera ou exclui. Sê todo em cada coisa, põe quanto és no mínimo que fazes. Assim em cada lago a lua toda brilha, porque alta vive." Tiro a lição que humanizar-se é um trabalho para a vida toda, que não pode prescindir dessas experiências de morte. Uma ostra deve ser ferida para produzir pérolas. A humanidade passa por essas experiências para descobrir a possibilidade de ir além de si mesma, para que possa ir fundo à razão de sua existência e se espantar que a vida vive e a morte morre, afinal, o espanto, a admiração, o silêncio frutuoso que precede à palavra falada, escrita e cantada é o alicerce da verdadeira filosofia, que é humilde, não se arroga sábia, todavia, busca a sabedoria e como Sócrates, sabe que nada sabe.
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