quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

A falácia do Bolsa Família



O governo brasileiro anunciou a ampliação do programa Bolsa Família para as famílias que recebem menos de R$: 70,00. Com isso, o governo vai desembolsar uma bagatela de mais de R$: 920 milhões por ano ao aplicar a complementação de renda para essas famílias que estão nessa situação. 

A medida traz em si a presunção erradicar a miséria. Sim, na estatística! De fato, a medida ocasiona acomodação para quem dela desfruta. Se o governo me fornece um “salário”, porque razão tal esforço de lutar pra trabalhar?

A medida serve muito mais a um governo que não está interessado no progresso pleno do brasileiro, pois está mais preocupado com as estatísticas para demonstrar aos países do primeiro mundo (para ficarmos “bonito na fita”) que também podemos ser capaz de extirpar a miséria no país abençoado por Deus e bonito por natureza. Argumento tautológico, falacioso! Postura hipócrita politicamente correta, mas não efetiva para um combate decisivo para a erradicação da miséria!

Por um tempo, a medida pode atender a essa demanda, mas não vai à raiz do problema: a ausência de uma estrutura inclusiva, que absorva essas pessoas para o mercado de trabalho.  Será que esses R$: 920 milhões por ano, fora a bolada já investida no programa Bolsa Família, não daria pra, pelo menos, iniciar essa estrutura inclusiva? A quem interessa, de fato, a manutenção de um mecanismo maquiador de um grave problema social, sem realmente fornecer uma resposta consistente? Seria somente a quem quer se perpetuar no poder ou também pra quem pretende alcançá-lo?

Ao criar condições para que essa estrutura inclusiva do trabalho se torne realidade, país e indivíduo se desenvolvem e não apenas crescem. Quem se desenvolve, cresce em plenitude! Mas quem cresce, não necessariamente se desenvolve! Quem se desenvolve, cria fundamentos sólidos para não mais voltar à realidade precária em que se encontrava,  e vislumbrando um horizonte de possibilidades a sua frente. Quem cresce, simplesmente sem se desenvolver, atua de maneira imediatista, atacando efeitos, sem nunca chegar ao âmago da causa. Gera outros problemas a partir da causa não resolvida. É a idéia da bolha, que cresce, cresce, cresce e … estoura!

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Análise da situação da Igreja no Brasil por João Paulo II



Em 1985, o então Papa João Paulo II em seu pronunciamento aos bispos do Brasil dos regionais I e V, chama a atenção dos prelados que não é o caso adaptar o depósito da fé, ao gosto do tempo atual, pelo estranho argumento que hoje o homem não compreende. A fé cristã não admite instrumentalizações!

E o que chama mais atenção quanto à instrumentalização da fé é o crescimento vertiginoso de seitas, alternativas imediatistas do sagrado. Então, João Paulo II questiona os prelados brasileiro em tom de cobrança: A difusão das seitas não nos interroga se tem sido manifestado suficientemente o senso do sagrado?”(Sínodo Extraordinário dos Bispos, 1985, Relatório Final II, A. 1).

Muitos são os motivos do êxodo de pessoas freqüentavam a Igreja a passarem para essas seitas. Falta de esclarecimento com relação à doutrina e extrema ignorância religiosa aliado a uma atmosfera que favorece a permissividade moral e o relativismo, busca imediata de respostas (abrange a busca utilitarista dos milagres), tibieza e inércia episcopal, sacerdotal e laical no que tange o processo de evangelização do povo, o aliciamento através de uma boa acolhida, coisa que deixa muito a desejar nos nossos templos.

João Paulo II analisa que o católico brasileiro é muito apegado aos sinais exteriores da fé. Ocorre que ele aponta que os sinos que chamavam as pessoas para a Igreja, ou que fazia lembrar que ali se iniciara uma celebração foram retirados. Músicas que se intitulam litúrgicas e que estão longe de levar uma pessoa à oração, à reflexão, quase sempre de cunhos políticos ou terrenos levam para a dispersão.

O papa expressa com todas as letras, ao tratar acerca das celebrações litúrgicas: “O ministério da Palavra, que está intimamente ligado à Liturgia Eucarística (cf. Sacrosanctum Concilium, 56), contenha sempre, do início ao fim, uma mensagem espiritual. É certo que há tanta gente que não possui o suficiente para acalmar a própria fome, mas, ordinariamente, o povo tem mais fome de Deus que do pão material, pois entende que “não só de pão vive o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus” (MT 4, 4).” E se o povo não encontra uma boa acolhida, uma boa palavra, e não tem um encontro pessoal (coração) e público (comunidade) com Deus, nos modelos alternativos de fé irá encontrar uma boa acolhida e ótimo tratamento.

Ele também menciona que a Igreja não é como uma promotora da reforma social, apesar dela estar no mundo e continuar formando mentalidade, consciências para o bem comum. Uma clara crítica à Teologia da Libertação com hermenêutica marxista. É salutar esclarecer que há outras Teologias da Libertação que não se orientam pelo marxismo, estando em consonância com a Doutrina Social da Igreja e que são muito úteis.

O papa mais uma vez questiona em tom de cobrança: “Não estaria havendo uma certa acomodação deixando de ir em busca das ovelhas que estão afastadas? Ao contrário da parábola evangélica, não é uma e outra que está tresmalhada (perdida), mas é uma parte do rebanho.” É impressionante a apatia de muitos clérigos e leigos.

João Paulo II alerta que é preciso disponibilidade, alicerçada na plena liberdade da amizade com Cristo. É preciso ir ao encontro do povo, já que ele não vem até nós. Ir como missionários, sem medo de receber um não, sem medo de não ser recebido!  Padre Dehon, fundador da Congregação dos Padres do Sagrado Coração de Jesus dizia que os sacerdotes não podem ficar enclausurados em suas sacristias vendo a banda passar, deviam ir ao povo, misturando-se com eles para servi-los. Mais urgente ainda é esse recado aos leigos, mas com a devida instrução e orientação de seus sacerdotes!   

Ir ao povo pressupõe uma formação à altura das exigências dos tempos pós-modernos, não basta entusiasmo, não bastam conhecimentos de Filosofia, Teologia, História, Antropologia, Sociologia, mas uma síntese entre oração e ação, fé e obras, como diria padre Dehon: “Vamos ao povo para iluminá-lo, instruí-lo, amá-lo. Vamos a ele com um programa preciso, com obras verdadeiramente populares, com uma atividade incessante. Vamos ao povo com uma verdadeira ciência social e com obras. Mostremos os verdadeiros remédios para o mal social. Amemos o povo, defendamo-lo e ele nos amará e defenderá. É preciso infundir o espírito de justiça e amor aos pequenos, na vida social” (cf. 1ª, 4ª, 5ª e 6ª conferências Romanas).


quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Bento XVI, o humilde intelectual da vinha do Senhor




Bento XVI pode ser considerado o papa das virtudes teologais, papa do amor, da esperança e da fé, o papa que aproximou mais a Igreja do mundo da cultura e dos círculos acadêmicos, sem deixar de falar aos mais simples, com uma linguagem clara, precisa e com a segurança que lhe é peculiar. Um profundo teólogo, de altos conhecimentos, que conseguia traduzir a fé em palavras simples, de fácil alcance. Papa da conjugação entre fé e razão, fé e esperança, caridade e esperança, caridade e verdade, discipulado e missionariedade. Em um mundo descrente da palavra humana e da Palavra Divina que se fez carne e habita entre nós, um homem que não tem pressa em dizer e quando diz, diz com propriedade, com conhecimento de causa. Vamos retomar os principais escritos, discursos, acontecimentos dos 8 anos de pontificado de Bento XVI que deixa marcas profundas e indeléveis na vida da Igreja.

Já na missa “Pro Eligendo Romano Pontífice”, o cardeal Joseph Ratzinger denunciava que a barca dos cristãos fora surpreendida por inúmeras ideologias e modas como que arremessadas do marxismo ao liberalismo, até a libertinagem, ao coletivismo radical; do ateísmo a um vago misticismo religioso; do agnosticismo ao sincretismo. E afirma que uma fé adulta não é seguir modas do momento, mas estar unido primeiramente a Cristo, amizade que nos faz humanos na plenitude dessa palavra e nos fornece o critério para discernir entre verdade e engano. O próprio Ratzinger afirma que ter uma clareza da fé professada, muitas vezes se torna motivo para o cristão ser rotulado como fundamentalista. Isso porque vivemos em uma ditadura do relativismo, que põe em questão não somente valores religiosos, mas valores humanos e tudo o que se reconhece como definitivo.

E o grande intelectual Joseph Ratzinger, que tinha sido prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, possuindo 8 doutorados Honoris Causa, se tornou Papa Bento XVI, dizendo em seu primeiro discurso que os cardeais o tinham elegido depois do grande Papa João Paulo II e o que o consolava o fato de Deus saber muito bem trabalhar com instrumentos insuficientes.

É o Papa do amor, pois no início do seu pontificado escreveu a encíclica “Deus caritas est”, apresentando que ser cristão não tem nada a ver com uma decisão ética ou uma idéia, mas é um encontro com a alguém que fornece um novo horizonte à nossa existência: O Deus Uno e Trino, que apresenta sua face humana, divina e misericordiosa através de Jesus Cristo. Nessa mesma encíclica, toca em temas de atualidades, como a banalização do amor, em sentido teórico e prático, alerta que a Igreja é o lugar privilegiado do amor, espaço na qual somos amados por Deus e formados para a grande missão de nossas vidas: ser sinal profético da presença de Deus entre os homens.

Em 28 de Maio de 2006, Bento XVI visitou o campo de concentração nazista de Auschwitz-Birkenau, palco de uma grande chacina humana, onde milhares de judeus de diversas nacionalidades foram executados em nome da suposta pureza racial sustentada por Hitler. O seu discurso questiona sobre o silêncio de Deus perante esse terror nazista, e pede a Deus que tal terror nunca mais seja visto na face da terra, pois se tratou de um vale escuro da humanidade. Tal discurso gerou admiração e perplexidade na mídia, principalmente entre os judeus.

No discurso na universidade de Regensburg em 2007 na Alemanha, Bento XVI pronuncia um discurso de defesa da fé católica, criticando o princípio da Sola Scriptura, de estirpe protestante, critica o pensamento teológico-liberal que predominou nos séculos XIX e XX e rechaça a ideologia niilista dos países que foram secularizados por uma ideologia racionalista e científica. Uma frase citada pelo Papa Bento XVI particularmente deixou o mundo islâmico agitado. Ao argumentar que o cristianismo é a religião da razão, do logos,  ele citou uma frase de Manuel II, o Paleólogo, que afirmava três aspectos sobre o Islamismo: 1-) O Islã adotara a violência como metodologia de conversão, 2-) a violência fora a única novidade apresentada pelo Islã e 3-) Nada justificaria uma conversão a partir da violência, mas sim através de uma apologética, uma persuasão racional.

Bento XVI, em 2007, publicou um motu próprio, que do latim significa vontade própria, afirmando a riqueza da missa tradicional em latim, o sacerdote de costas para o povo, de frente para Deus, do rito de São Pio V, que nunca foi revogada, e assumindo-a como rito extraordinário da Igreja Católica, pois não poucos abusos em matéria litúrgica afeta o rito ordinário da missa que foi assumida pós Concílio Vaticano II. Inúmeros bispos do mundo todo foram resistentes a essa colocação do papa, por acharem que seria um retrocesso retomar a liturgia tridentina (de caráter propiciatório e sacrifical) , que na argumentação deles, o povo não entenderia (o que de certa forma é controverso) e mesmo que fosse de maneira extraordinária.                                                                            

É o Papa da esperança, pois escreveu a encíclica “Spe Salvi”, ainda em 2007, que trata sobre a esperança cristã, em uma sociedade que é tão imediatista e utilitarista, como é a nossa. O Papa Bento XVI trata da intrínseca relação entre esperança e fé, onde afirma que a fé é substância da esperança. A fé cristã não se faz no mero seguimento de normas e preceitos, como uma mala pesada a ser levada nas costas. Trata-se de um olhar mais apurado e profundo, além do que conseguimos ver, algo que perpassa o “limite físico” da realidade na qual estamos inseridos. É aqui que é abordada a questão do purgatório, como fogo de amor que purifica, explicita o que vem a ser a vida eterna, que diferentemente do tempo, não representa uma sucessão de fatos com passado, presente e futuro, mas um “momento eterno” de mergulho no amor divino, na qual todo homem é chamado. A esperança cristã não é individualista, porque está alicerçada no amor, que possui uma dupla responsabilidade no mandamento divino: amar a Deus e amar o próximo. A esperança possui raízes profundas no amor, na caridade.

Em 2007 em sua visita pastoral, inaugurou os trabalhos da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Amercano e Caribenho, canonizou no campo de Marte o era então beato Frei Antônio de Sant’Ana Galvão, se encontrou com os jovens do estádio do Pacaembu, convocando os jovens a serem apóstolos dos jovens, vivendo a castidade e os valores perenes do Evangelho na grande missão da vida. Além disso, encontrou-se com políticos brasileiros, líderes religiosos, além de ter se hospedado no Mosteiro de São Bento em São Paulo.

O papa teve que lidar com um tema muito delicado: a pedofilia dos padres \ bispos. Em várias viagens como aos Estados Unidos, Malta, Reino Unido, Irlanda, por exemplo, encontrou-se com as vítimas dos abusos de clérigos. E publicamente pediu desculpas, ainda que tenha afirmado que o perdão não substitui a justiça e que os criminosos teriam que acertar as contas com a justiça civil. Alterou o código de direito canônico, prevendo uma pena pesada para o clérigo que abusasse de um menor. Enfrentou fortes protestos das famílias das vítimas, bem como da mídia.

Bento XVI também publicou a encíclica “Caritas in Veritate”, uma encíclica social, recordando que a caridade é a via mestra da doutrina social da Igreja. Afirma que caridade e verdade andam juntas, e que em um cristianismo de caridade sem verdade se assemelha a um depósito de sentimentos úteis para a sociedade, mas marginais. Sem verdade, a caridade cairia em um vago sentimentalismo. A função da verdade é fornecer a luz da razão e da fé, por meio da qual a inteligência pode chegar à verdade natural e sobrenatural da caridade, que significa doação, acolhida e comunhão com Deus e com os irmãos.

Em 2012 estourou o episódio que se chama Vatileaks, que envolveu o vazamento de documentos secretos do Vaticano, que relatam uma rede de corrupção de parceiros italianos. Paolo Gabriele, que era mordomo pessoal do papa, foi acusado de repassar informações ao jornalista Gianluigi Nuzzi, que publicou o livro Sua Santidade, as Cartas Secretas de Bento XVI, que trata de cartas confidencias entre o Papa e o seu secretário, relatando as politicagens, malandragens e confrontos entre facções secretas no Vaticano. Paolo Gabriele, que tinha sido preso, foi perdoado por Bento XVI em 22 de Dezembro de 2012.

É o Papa da fé, pois proclamou em 2013 o ano da fé ao publicar “Porta Fidei” tocando em temas como: o batismo é a porta de entrada na fé cristã, a redescoberta do caminho da fé em um mundo de profundas e rápidas transformações. O papa também aponta para a descoberta de Jesus como palavra encarnada, que sacia o coração de todo homem, a fé que torna a pessoa paciente, serena, moldada pelos princípios do Evangelho, o conhecimento dos conteúdos da fé, pois o coração indica um aspecto pessoal, íntimo e a boca um aspecto público, comunitário. O estudo do Catecismo da Igreja Católica é importante para o cultivo e progresso da vida de fé de cada cristão. Ainda reforça que a fé e a caridade andam juntas, e não podem ser desvinculadas. Bento XVI reforça a urgência de sermos firmes na fé, não negligenciando da vida de fé, alimentando-a com estudos da vida dos santos, da doutrina católica, a Eucaristia e fazer a diferença do mundo de hoje, seja por palavras, seja por atitudes.

Em 11-02-2013, o mundo recebe atônito a notícia de que Sua Santidade, o Papa Bento XVI apresenta sua renúncia ao ministério petrino, alegando dificuldades físicas e de saúde para tocar a barca de Pedro que é a Igreja. Imagino como simples cristão, as sucessivas traições que recebestes de seus colaboradores direitos e indiretos, membros da Cúria, bispos, sacerdotes, religiosos, e porque também não dizer dos leigos! Ficaste calado, rezando, juntando seu sofrimento à Paixão de Cristo, que também fora abandonado por seus amigos, quando o Senhor quis precisar da ajuda deles. O que tenho a dizer é muito obrigado, cresci muito como homem e católico, lendo seus escritos, te acompanhando através de suas mensagens, deixarás saudade pela firmeza, perspicácia, amor e humildade na qual guiava o timão da Igreja. Com certeza, está entre os melhores pensadores, críticos da modernidade, em nosso tempo. Poderia ter ficado até o final de sua vida, mas decidiu sair, para mostrar que ninguém é eterno em lugar nenhum e que todo posto de poder e influência é na verdade um serviço a Deus, que não precisa do nosso serviço, mas quis precisar, e aos irmãos. Continuarás sendo meu pai na fé e de outros tantos que sofrem, rezam, admiram seu exemplo e que agradece a Deus pelo dom da sua vida. O Brasil que iria te receber novamente, receberá seu sucessor com a mesma alegria que se fosse você! Deus te abençoe por todo o bem, todo o amor, todo o sofrimento em favor da Igreja e da humanidade! Sede bendito, Papa Bento XVI !